o começo tem que ser capenga mesmo
tentando te convencer de que, sem amarras, as coisas fluem incrivelmente bem
Ter certeza de tudo é impossível, e mesmo assim eu ouso afirmar com todas as letras que a primeira versão de tudo que amamos é ruim. Entender que os melhores livros tiveram um primeiro rascunho repleto de erros ortográficos e furos na narrativa é essencial. As músicas mais tocantes começaram a partir de diversas tentativas falhas de encontrar aquela melodia perfeita, capaz de transmitir os mais singelos e reconfortantes sentimentos. A primeira corrida daquele atleta mundialmente conhecido foi composta por mil e uma pausas para que ele pudesse recuperar o fôlego e alongar as panturrilhas. Toda conquista demanda escaladas e um passo para trás e três para frente. Pausa e reflexão. O etéreo requer calma e paciência, e é claro que isso é frustrante – mas também é libertador.
“Didion said I should come up with story ideas on my own and write them, no matter if they ever got published. I should do the work of journalism without the thought of how much I would be paid [...] It's the writing that's important, not the publishing.” - Keith Sharon1
Essa semana batemos 1000 inscritos no corta pra mim e eu tenho refletido muito sobre as circunstâncias que me alinharam e me impulsionam a começar essa newsletter. Meu sonho antigo e especial pareceu, por muitos anos, inconcebível. A pressão que eu colocava na possibilidade de escrever e compartilhar minhas palavras com o mundo era tão intensa que eu não percebia que ela existia – como quando a gente sente tanta fome que chega um ponto em que a fome deixa de se fazer presente. Sufocada pelo inexistente e o inominável. Chega a parecer bobo e até inocente revisitar essas sensações estando no outro lado da montanha. Mas no começo de tudo, elas calavam os menores suspiros, os rascunhos de uma nova ideia.
“Didion once told a participant in a writing seminar that to get through writer’s block, you had to write one sentence, and then another, and then another.
To be a writer, you must write.”2
No meio do caminho, eu sem querer percebi que às vezes basta começar. Caneta no papel, sem questionamentos lógicos e dúvidas gritantes. O sentimento lidera e o coração bota pra fora a essência de tudo. Ele não liga para nenhuma percepção alheia, visto que está um pouco ocupado no processo de bombear seu sangue e espalhá-lo pelo organismo. Nas horas vagas do almoço e do lanche da tarde, ele é tomado pela vontade de visitar a vida real e faz questão de marcar sua visita com palavras e parágrafos. Uma explosão insustentável, as cócegas que sugam o ar, aquela risada intensa que faz sua barriga doer. Não existe outra saída a não ser ceder ao chamado, ouvir com atenção e se deixar ser um veículo para sua paixão.
Então, querido leitor, eu te convido a dar um primeiro passo capenga e desleixado. E, por mais cafona que isso possa soar e ressoar, peço que você dê uma chance a você mesmo. Se sua intuição te deixa inquieto e te impulsiona para algum lugar ou ação, se dê o benefício da dúvida. Escreva, ou cante, ou corra para e por você e mais ninguém. E faça tudo isso da maneira mais simples possível, um fluxo de consciência fadado a um desempenho inferior – faz parte do processo. Primeiro você faz, depois você retoca e aperfeiçoa, lapida e reconstroi. Abre as portas, prende o cabelo sob esse sol de 40º e dá o primeiro passo, sabendo que a chance de você tropeçar e cair de bunda no chão é bem grande. Mas quem te impede de achar o equilíbrio perfeito?
fujo da escrita como quem foge de mim mesma (por mais piegas que isso possa parecer) e, consequentemente, fujo dos outros, porque raramente compartilho qualquer coisa que eu escrevo com alguém. que diacho eu tô fazendo com aquilo que mais me faz viva, não é mesmo?! enfim, obrigada! 🫶🏼
a gente tem tanto medo de tudo, por quê será que somos assim? temos medo de fazer as coisas que mais vão nos fazer bem, que engraçado. texto muito brabo e necessário 💝